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Tecnologia barata para produzir alimentos é adotada por 4,5 mil famílias em 12 estados


Uma das tecnologias sociais mais potentes desenvolvidas pela pesquisa brasileira se espalha pelo País e já beneficia mais de 4,5 mil famílias de 12 estados, além de estar operando com sucesso em sete países africanos. Conhecido como “Sisteminha”, o Sistema Integrado de Produção de Alimentos é um pacote tecnológico de baixo custo capaz de gerar alimentos para o consumo próprio de pequenos produtores rurais a ainda um excedente para incrementar a renda. Seus impactos para a sociedade o colocaram entre os destaques do mais recente Balanço Social da Embrapa.
 
 
Lançado em 2011 (veja quadro “A origem do Sisteminha”) e fruto de parceria entre Embrapa, Universidade Federal de Uberlândia (UFU) com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), o Sisteminha é adaptado para pequenos espaços, até um hectare, e consiste em um tanque para a criação de peixes que pode ser associado a outros 14 módulos produtivos como, por exemplo, minhocas, hortaliças e ruminantes, de acordo as condições locais (veja quadro “Como funciona”). Ele foi dimensionado para atender as necessidades nutricionais de uma família de quatro pessoas, de acordo com as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).
 
Hoje, a tecnologia opera com sucesso nos estados do Piauí, Maranhão, Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Norte, Ceará, Pará, Acre, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Paraná. No continente africano, é empregada em Gana, Uganda, Etiópia, Camarões, Tanzânia, Angola e Moçambique.
 
Transformando vidas
 
Nos locais onde foi adotado, famílias que antes não tinham renda fixa passaram a ter mais comida na mesa e a ganhar, em média, um salário mínimo por mês com a venda dos produtos em feiras livres. Dois exemplos em comunidades pobres que adotaram o Sisteminha estão no sertão nordestino.
 
No município de Inajá, a 396 quilômetros a sudoeste do Recife, 20 famílias carentes de cinco comunidades trabalham em 13 unidades do Sistema, melhorando a alimentação e com uma renda diária que vem da comercialização do excedente da produção e pelo que deixaram de gastar. O assentamento indígena Kambiwá Caraibeirinhas é o destaque. Dez mulheres, de duas famílias, operam cinco módulos e ganham em média 1,5 salário mínimo, cada uma.
 
Além da produção de peixes, elas cultivam alface, coentro, berinjela, couve, rúcula, salsa, abóbora, feijão, milho, melancia, acerola, coco, limão, laranja, banana, tomate, mamão, maracujá, abacaxi, cebolinha, maxixe, morango e caju. A coordenadora da Associação ProVida, que incentivou a adoção do Sisteminha em Inajá, Cláudia Leal, projeta a implantação de unidades da tecnologia nos municípios de Floresta, Salgueiro e Manarí, todos no sertão pernambucano. Manarí, no início dos anos 2000, foi considerado o município mais pobre do Brasil por ter um baixíssimo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
 
Do assentamento “Maria Otília”, no povoado Juazeiro dos Cândidos, também em Inajá, vem um exemplo da força do associativismo nas comunidades rurais. Doze famílias se revezam, por meio de uma tabela de divisão de tarefas, no trabalho diário de duas unidades do sistema e têm obtido sucesso. Francisco Jonaci dos Santos Lima coordena o trabalho, distribui as tarefas e divide os resultados. Toda a produção ainda é para o consumo das famílias. “Vamos avançar para vender o excedente e ter renda”, projeta Lima.
 
Missão no reforço alimentar
 
No distrito de Maruá, a 50 quilômetros do município de Juazeiro, no sertão da Bahia, a força do associativismo também está mudando a vida de uma comunidade inteira. Vinte famílias, organizadas em permanente mutirão pela Agência Missionária para Evangelização do Sertão, organização não-governamental (ONG) com sede no Espírito Santo, operam uma unidade com peixes, frutas, milho, feijão e hortaliças. A maioria tem atividades paralelas, mas mantém no Sisteminha o reforço alimentar. Cada família trabalha em uma área de 600 metros quadrados. A área total é de 30 mil metros quadrados.
 
Silvan Pereira de Oliveira, de 36 anos, casado e pai de três filhos, não tem emprego formal e hoje sobrevive do que produz na unidade do sistema. “O Sisteminha mudou totalmente a minha vida e de minha família”, diz Oliveira, o mais entusiasmado da comunidade com a tecnologia. Instalada em abril de 2018, a unidade opera com a produção de peixes e o cultivo de melancia, milho, feijão, couve, hortaliças em geral e criação de galinha de postura, para produção de ovos, e frango de corte.
 
O incentivador do Sisteminha em Maruá é o pastor Thiago Neves de Sousa, um capixaba que mora na Bahia desde 2017, em missão da ONG. Além de projetar a expansão do sistema para outras comunidades pobres do sertão baiano, Sousa quer modular a tecnologia em Maruá com pequenos animais, como caprinos, ovinos, suínos, codornas e porquinhos-da-índia e ampliar o número de famílias beneficiadas. “Tentaremos alcançar o maior número possível de pessoas”, afirma. No povoado moram cerca de 300 famílias.
 
O Sisteminha chegou também ao ensino superior. Na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), em Juazeiro, a unidade implantada em uma área de 1,3 mil metros quadrados, no Espaço Plural, vem capacitando comunidades rurais e orientando estudantes nos trabalhos de conclusão de curso (TCC) nas áreas de agronomia, veterinária e zootecnia. A implantação do módulo foi em agosto de 2018, com piscicultura, criação de galinhas de postura, frangos de corte, codornas, porquinhos da índia e minhocultura, que dividem espaço com milho, tomate cereja, abóbora e macaxeira.
 
Um dos idealizadores da tecnologia, o pesquisador Carlos Guilherme da Embrapa Meio Norte (PI), considera que a maior diferença entre o Sisteminha e os outros modelos de produção familiar é a prática do escalonamento da produção e o fato de não haver comprometimento da produção com o mercado. O cientista explica que o escalonamento propicia o consumo sem interrupção o ano todo e a diversidade de produtos garante a sustentabilidade.
 
De acordo com ele, é importante contabilizar também a economia obtida ao deixar de comprar os produtos que são gerados localmente. “Ao consumi-los diretamente, agrega-se todos os valores da cadeia produtiva”, pontua ao ressaltar outra vantagem importante do sistema: as sobras geradas podem estimular o empreendedorismo da família. “Quando isso acontece, ao comercializar diretamente os excedentes, a família aprende, com o mínimo risco de perda, a lidar com o mercado”, avalia. As informações são do site Agrolink.