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Aquicultura pode dobrar em dez anos
Luciana Franco
" A produção de tilápia cresceu 17% nos últimos quatro anos no mercado interno"
Um estudo inédito realizado pelo banco Rabobank sugere que a aquicultura pode, na próxima década, se tornar a nova fronteira de proteína animal no Brasil. Dados do documento, o primeiro que a entidade realiza sobre o setor, mostram que a produção de peixes em cativeiro alcançará 960.000 toneladas em 2022, o dobro em relação às 479.000 produzidas em 2010, e terá como carro-chefe a tilápia, cujo volume alcançará 413.000 toneladas naquele ano, alta de 166% em comparação à produção de 2010. “O Brasil já é sexto maior produtor de tilápia do mundo e possui as condições para se tornar uma grande potência, podendo competir com produtores como Tailândia, Noruega e China”, diz o economista Guilherme Melo, que assinou o estudo. Para ele, a crescente demanda interna já justifica novos investimentos.
Globo Rural > Quais são os principais destaques do estudo?
Guilherme Melo > Achamos que a aquicultura apresenta um potencial bastante grande do ponto de vista global, podendo vir a ser uma das próximas fronteiras de proteína animal no Brasil, uma vez que é a mais consumida no mundo e também a que mais cresce, com aumento tanto nos países em desenvolvimento quanto nos desenvolvidos. De um lado está a pesca extrativa, com crescimento bastante limitado, porque há restrição de recursos para esse segmento; e de outro a aquicultura, com grande possibilidade de desenvolvimento e que contempla a criação em cativeiro.
GR > No Brasil, a demanda também cresce?
Melo > A demanda está bastante aquecida e a produção de pescado – aquele oriundo da pesca extrativista – tende a não crescer mais, uma vez que está estável desde 2005, em torno de 90 milhões de toneladas. Portanto, o aumento da oferta terá de vir da aquicultura. A produção de peixes em cativeiro terá de aumentar para dar suporte ao aumento da demanda. O Brasil tem todas as condições necessárias para ser uma potência nesse mercado, com grande quantidade de água disponível e ampla produção de grãos. O desenvolvimento dessa cadeia poderia nos jogar no cenário internacional.
GR > Hoje, o Brasil não é um player importante no exterior?
Melo > Não. Eu até usei um termo para classificar a aquicultura no Brasil, dizendo que estamos ainda na infância. Hoje, o mundo produz 168 milhões de toneladas de pescados, e o Brasil apenas 1,2 milhão. É uma participação bastante baixa, mas existe um potencial para crescer. Primeiro, com o mercado doméstico, que está crescendo sustentado por vários fatores, como o aumento de renda, o fato de o peixe ser um alimento saudável e a cozinha japonesa, que veio para ficar.
GR > Existe um carro-chefe na aquicultura brasileira?
Melo > Sim, é a tilápia. Um dos pontos que abordamos no estudo é que existem 40 espécies de peixes que podem ser comercializadas, o que torna a indústria muito fragmentada e dificulta a concentração de pesquisa, pois cada espécie requer uma genética específica, uma ração específica e um pacote tecnológico específico. Teríamos de nos concentrar em poucas espécies, e a tilápia, dentre essas, se destaca porque já tem um pacote tecnológico, e a produção cresceu a taxas altas, superando os 17% nos últimos quatro anos no mercado interno. Esse é sem dúvida um segmento no qual o Brasil pode concentrar esforços.
GR > Esse é um peixe também importante no cenário internacional?
Melo > O comércio internacional de tilápia é bastante grande. A China é o principal exportador e os Estados Unidos o principal importador. Cerca de 90% das importações americanas são supridas pela China, que veio num crescimento muito rápido. Em dez anos, os chineses quase triplicaram a produção, mas acreditamos que esse crescimento vai desacelerar nos próximos anos, justamente pelo fato de que o custo da mão de obra, apesar de ainda ser baixo, tende a crescer. Além disso, a China é um grande importador de grãos, o que encarece a produção de ração.
GR > O Brasil é um grande importador de peixes?
Melo > Importamos 323.000 toneladas em 2011, a maioria desse volume se refere a peixes brancos que vieram do Chile e da Noruega, o que também demonstra o potencial que há por aqui. Parte desses peixes brancos poderia ser produzida aqui. Mesmo assim, o crescimento da demanda interna ainda dependerá de produtos importados, pois não conseguimos produzir, por exemplo, o salmão e o bacalhau no Brasil. E isso também é outra janela de oportunidades, uma vez que as grandes empresas de seafood estarão atentas ao fornecimento do mercado interno. O consumo no Brasil é de apenas 9,4 quilos de peixe por habitante ao ano, abaixo do recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), de 12 quilos, e da média mundial, de 18 quilos.
GR > Como é o movimento das empresas internacionais no Brasil?
Melo > Muito pequeno, porque a cadeia nacional ainda não é estruturada. Existem algumas barreiras que precisamos ultrapassar para que as coisas comecem a acontecer. Há falta de informações sobre o setor, há demora na emissão de licenças para cessão de uso de água, uma vez que existem vários órgãos que fazem parte desse trâmite. Outra questão complicada é o estabelecimento de regras de biossegurança para o setor. Há ainda a indústria de ração, que é forte para suínos e aves, ao passo que para aquicultura está em fase de crescimento. Se o setor focasse em algumas espécies, ficaria mais fácil puxar o crescimento da aquicultura.
GR > Quais outros peixes são relevantes comercialmente?
Melo > Temos o camarão, que tem grande demanda nos mercados interno e externo, o tambaqui, que é um peixe que tem caído no gosto da população, cuja produção somou 54.000 toneladas em 2010, além do pirarucu, que também vem apresentando uma trajetória de crescimento no mercado interno, tem um rendimento de carcaça razoável e, para a indústria, seria interessante. Acreditamos que a melhor forma de estimular esses segmentos seria a adoção de um modelo semelhante ao usado pelas empresas de suínos, de integração, em que a indústria garante escala de produção e também auxilia na extensão rural e no manejo no campo.
GR > Qual é o potencial de produção para a aquicultura brasileira?
Melo > Fizemos uma projeção conservadora e notamos que daria para dobrar a produção em 12 anos, mesmo assumindo uma taxa de crescimento de apenas 50% do que foi observado nos últimos dez anos, o que pode ser factível, pois partimos de uma base pequena. Fizemos também uma projeção de aumento de consumo e o indicador que apuramos foi que sairíamos do atual 1,8 milhão de toneladas para 2,6 milhões em seis anos, chegando bem perto do consumo de suínos no Brasil, que é de 2,9 milhões de toneladas. Fonte: Revista Globo Rural
" A produção de tilápia cresceu 17% nos últimos quatro anos no mercado interno"
Um estudo inédito realizado pelo banco Rabobank sugere que a aquicultura pode, na próxima década, se tornar a nova fronteira de proteína animal no Brasil. Dados do documento, o primeiro que a entidade realiza sobre o setor, mostram que a produção de peixes em cativeiro alcançará 960.000 toneladas em 2022, o dobro em relação às 479.000 produzidas em 2010, e terá como carro-chefe a tilápia, cujo volume alcançará 413.000 toneladas naquele ano, alta de 166% em comparação à produção de 2010. “O Brasil já é sexto maior produtor de tilápia do mundo e possui as condições para se tornar uma grande potência, podendo competir com produtores como Tailândia, Noruega e China”, diz o economista Guilherme Melo, que assinou o estudo. Para ele, a crescente demanda interna já justifica novos investimentos.
Globo Rural > Quais são os principais destaques do estudo?
Guilherme Melo > Achamos que a aquicultura apresenta um potencial bastante grande do ponto de vista global, podendo vir a ser uma das próximas fronteiras de proteína animal no Brasil, uma vez que é a mais consumida no mundo e também a que mais cresce, com aumento tanto nos países em desenvolvimento quanto nos desenvolvidos. De um lado está a pesca extrativa, com crescimento bastante limitado, porque há restrição de recursos para esse segmento; e de outro a aquicultura, com grande possibilidade de desenvolvimento e que contempla a criação em cativeiro.
GR > No Brasil, a demanda também cresce?
Melo > A demanda está bastante aquecida e a produção de pescado – aquele oriundo da pesca extrativista – tende a não crescer mais, uma vez que está estável desde 2005, em torno de 90 milhões de toneladas. Portanto, o aumento da oferta terá de vir da aquicultura. A produção de peixes em cativeiro terá de aumentar para dar suporte ao aumento da demanda. O Brasil tem todas as condições necessárias para ser uma potência nesse mercado, com grande quantidade de água disponível e ampla produção de grãos. O desenvolvimento dessa cadeia poderia nos jogar no cenário internacional.
GR > Hoje, o Brasil não é um player importante no exterior?
Melo > Não. Eu até usei um termo para classificar a aquicultura no Brasil, dizendo que estamos ainda na infância. Hoje, o mundo produz 168 milhões de toneladas de pescados, e o Brasil apenas 1,2 milhão. É uma participação bastante baixa, mas existe um potencial para crescer. Primeiro, com o mercado doméstico, que está crescendo sustentado por vários fatores, como o aumento de renda, o fato de o peixe ser um alimento saudável e a cozinha japonesa, que veio para ficar.
GR > Existe um carro-chefe na aquicultura brasileira?
Melo > Sim, é a tilápia. Um dos pontos que abordamos no estudo é que existem 40 espécies de peixes que podem ser comercializadas, o que torna a indústria muito fragmentada e dificulta a concentração de pesquisa, pois cada espécie requer uma genética específica, uma ração específica e um pacote tecnológico específico. Teríamos de nos concentrar em poucas espécies, e a tilápia, dentre essas, se destaca porque já tem um pacote tecnológico, e a produção cresceu a taxas altas, superando os 17% nos últimos quatro anos no mercado interno. Esse é sem dúvida um segmento no qual o Brasil pode concentrar esforços.
GR > Esse é um peixe também importante no cenário internacional?
Melo > O comércio internacional de tilápia é bastante grande. A China é o principal exportador e os Estados Unidos o principal importador. Cerca de 90% das importações americanas são supridas pela China, que veio num crescimento muito rápido. Em dez anos, os chineses quase triplicaram a produção, mas acreditamos que esse crescimento vai desacelerar nos próximos anos, justamente pelo fato de que o custo da mão de obra, apesar de ainda ser baixo, tende a crescer. Além disso, a China é um grande importador de grãos, o que encarece a produção de ração.
GR > O Brasil é um grande importador de peixes?
Melo > Importamos 323.000 toneladas em 2011, a maioria desse volume se refere a peixes brancos que vieram do Chile e da Noruega, o que também demonstra o potencial que há por aqui. Parte desses peixes brancos poderia ser produzida aqui. Mesmo assim, o crescimento da demanda interna ainda dependerá de produtos importados, pois não conseguimos produzir, por exemplo, o salmão e o bacalhau no Brasil. E isso também é outra janela de oportunidades, uma vez que as grandes empresas de seafood estarão atentas ao fornecimento do mercado interno. O consumo no Brasil é de apenas 9,4 quilos de peixe por habitante ao ano, abaixo do recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), de 12 quilos, e da média mundial, de 18 quilos.
GR > Como é o movimento das empresas internacionais no Brasil?
Melo > Muito pequeno, porque a cadeia nacional ainda não é estruturada. Existem algumas barreiras que precisamos ultrapassar para que as coisas comecem a acontecer. Há falta de informações sobre o setor, há demora na emissão de licenças para cessão de uso de água, uma vez que existem vários órgãos que fazem parte desse trâmite. Outra questão complicada é o estabelecimento de regras de biossegurança para o setor. Há ainda a indústria de ração, que é forte para suínos e aves, ao passo que para aquicultura está em fase de crescimento. Se o setor focasse em algumas espécies, ficaria mais fácil puxar o crescimento da aquicultura.
GR > Quais outros peixes são relevantes comercialmente?
Melo > Temos o camarão, que tem grande demanda nos mercados interno e externo, o tambaqui, que é um peixe que tem caído no gosto da população, cuja produção somou 54.000 toneladas em 2010, além do pirarucu, que também vem apresentando uma trajetória de crescimento no mercado interno, tem um rendimento de carcaça razoável e, para a indústria, seria interessante. Acreditamos que a melhor forma de estimular esses segmentos seria a adoção de um modelo semelhante ao usado pelas empresas de suínos, de integração, em que a indústria garante escala de produção e também auxilia na extensão rural e no manejo no campo.
GR > Qual é o potencial de produção para a aquicultura brasileira?
Melo > Fizemos uma projeção conservadora e notamos que daria para dobrar a produção em 12 anos, mesmo assumindo uma taxa de crescimento de apenas 50% do que foi observado nos últimos dez anos, o que pode ser factível, pois partimos de uma base pequena. Fizemos também uma projeção de aumento de consumo e o indicador que apuramos foi que sairíamos do atual 1,8 milhão de toneladas para 2,6 milhões em seis anos, chegando bem perto do consumo de suínos no Brasil, que é de 2,9 milhões de toneladas. Fonte: Revista Globo Rural