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​Crise hídrica: manejo do pirarucu supera a seca extrema


Desde o final de setembro, uma seca extrema castiga o Amazonas, ameaçando a pesca e os meios de subsistência na região. Surpreendentemente, o manejo do pirarucu emerge como um ponto positivo em meio aos desafios, encerrando o ano com resultados positivos apesar da estiagem persistente. Diante desse cenário crítico, o Governo Federal anunciou medidas emergenciais para combater a crise hídrica, incluindo um Auxílio Extraordinário destinado a pescadoras e pescadores artesanais beneficiários do seguro defeso.
 
A estiagem histórica dos rios amazônicos em 2023 tem sido especialmente desafiadora para os manejadores de pirarucu, que enfrentaram uma série de problemas para a realização da atividade. Dificuldades de acesso aos lagos de pesca e aumento dos custos foram alguns dos problemas que as comunidades tiveram que lidar. As mudanças do clima, somadas ao fenômeno do El Niño, ajudam a explicar a maior estiagem já enfrentada no Amazonas.
 
"Em relação aos anos anteriores, a seca do rio fez com que aumentasse muito o tempo da pesca e do transporte do pirarucu. Em 2022, fechamos a pesca em 12 dias e neste ano levamos 21 dias. Quanto mais tempo, mais custos", explica Francisco Paumari, coordenador de manejo do povo Paumari, atividade realizada nas três Terras Indígenas localizadas ao longo do rio Tapauá.
 
Apesar das dificuldades impostas pela estiagem, o povo Paumari conseguiu pescar 495 pirarucus, totalizando aproximadamente 30,5 toneladas de pescado. Francisco atribui a conquista à forte união do povo Paumari e a importante parceria de iniciativas como o Raízes do Purus, projeto realizado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) e patrocinado pela Petrobras e Governo Federal, que apoia o manejo do povo Paumari desde 2013.
 
"A gente tem bastante união e empenho para fazer as coisas acontecerem. Eu acho que essa atitude dá um exemplo para os outros que estão começando, que querem começar essa atividade. Na união é que nós conseguimos as coisas", avalia o coordenador.
 
Estratégias
 
Entre as estratégias adotas para a época, uma grande estrutura de manejo do povo Paumari: são quatro flutuantes - três grandes e um pequeno, que abrigam dormitórios, cozinhas, banheiros, além de uma estrutura para armazenamento do peixe e do motor de energia elétrica. Em anos anteriores, toda essa estrutura se movimentava ao longo do rio, ficando próxima aos lagos de pesca, para facilitar o trabalho dos pescadores.
 
Este ano foi o primeiro em que a estrutura ficou fixa em um único lugar, pois o nível do rio estava muito baixo e os flutuantes poderiam ficar encalhados em algum ponto. Essa mudança de estratégia causou um aumento nos custos de combustível, gelo e de manutenção das canoas. "Eu já consigo ver e sentir as mudanças climáticas. É uma coisa que vamos ter que lidar nos próximos anos, não vai parar por aqui", observa João Paumari, uma das 80 pessoas que compõem a equipe da pesca.
 
Outra estratégia adotada pelo povo foi a de pescar em lagos menores, mais centrais e com o acesso por terra. "Tinha lago que você gastava 12 minutos de quadriciclo. E gastava mais 10 a 15 minutos de canoa para transportar o peixe até o flutuante", relembra Francisco.
 
Depois de finalizada a pesca, a última etapa consistiu em transportar o pescado para o frigorífico que recebe a produção. Da cidade de Tapauá, onde estão as terras indígenas do povo Paumari, para o frigorífico, sediado na cidade de Manacapuru, são mais de 300 km de distância.
 
A responsabilidade de levar o resultado de 20 dias de trabalho do povo Paumari é grande e foi confiada a uma equipe composta por quatro jovens indígenas, que fizeram o trajeto pela primeira vez. Com rio seco, a equipe se deparou com dificuldades em vários trechos, mas os seis dias de viagem transcorreram sem incidentes e o pescado foi entregue com sucesso.
 
Alex Paumari foi o jovem responsável por coordenar a equipe e conta o sentimento em concluir o trabalho. "Foi a minha primeira vez nesse cargo e eu agradeço muito a confiança do meu povo. Estou muito emocionado por ter dado tudo certo, a vitória é de todos!", comemorou.
 
Encontro anual
 
Entre os dias 28 a 30 de novembro, representantes de 29 organizações, entre associações comunitárias, organizações não governamentais e órgãos de governo, se reuniram em Manaus (AM) para a 10ª Reunião do Coletivo do Pirarucu. O encontro teve como objetivo avaliar o manejo sustentável de pirarucu no ano de 2023, fortalecer estratégias e parcerias, além de projetar perspectivas de atuação do grupo em 2024.
 
Durante os três dias de evento, os 60 participantes da reunião debateram temas como os impactos da estiagem nas atividades do manejo, o andamento do processo de certificação orgânica do pirarucu, as possibilidades de acesso ao Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), regras internacionais de abate humanizado do pescado e aprimoramento da governança coletiva.
 
Ações do Governo
 
Em novembro, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, editou duas medidas provisórias (MPs) que determinam a abertura de crédito extraordinário de R$ 400 milhões para assistência à população da região Norte impactada pela seca histórica. As informações são do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA).
 
O crédito no valor de R$ 300 milhões irá para o Ministério da Previdência Social (MPS), vinculados ao pagamento do auxílio emergencial previsto em outra MP (1192/23), que instituiu o auxílio extraordinário destinado a pescadores e pescadoras profissionais artesanais beneficiários do seguro defeso cadastrados em municípios da região.
 
Outro crédito extraordinário de R$ 100 milhões, em favor do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), será destinado à aquisição e distribuição de alimentos da agricultura familiar para promoção da segurança alimentar e nutricional das famílias afetadas, além de apoiar as atividades econômicas rurais locais.
 
 Por Seafood Brasil
Créditos da imagem: José da Cunha Reis