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​Em tempos de crise, a meta é: focar no hoje, lembrando do ontem, sem esquecer do amanhã


Imaginando uma narrativa para tentar explicar o que está acontecendo em 2020, até o momento, começamos assim: de um lado, a carcinicultura brasileira, que caminhava para o ano recorde de produção, com uma ascensão forte para os próximos meses, refletidos pelos aumentos significativos de produtividades, e do outro, a partir do mês de março, para o Brasil, o encontro assustador com a COVID-19, trazendo impactos alarmantes para o bem-estar da vida humana e incertezas futuras com economia nacional e mundial, levando a transformações no modelo de comercialização em todos os segmentos.
 
A melhor temporada de produção do ano é o verão, período em que a influência das variações climáticas é menor, pois há mais estabilidade. Esse ano, devido ao reflexo de melhoramento genético promovido pelas larviculturas, pode-se considerar que esta temporada foi um sucesso, inclusive, animadora pela estabilidade de resultados. Exemplificando, em relação ao ano passado foi possível constatar que a produtividade saiu de 400-600 kg/ha em 2019 para o atual momento de 800-1000 kg/ha, então, dependendo das conjunturas de mercado e da liquidez dos produtores, essa tendência provavelmente poderá se manter ou aumentar para a próxima temporada.
 
Naturalmente, com o respectivo cenário, já se esperaria um ano de maior desafio para a comercialização de camarão, pois em qualquer segmento em que a oferta de um produto aumenta, a tendência do preço médio é de diminuição, apesar do consumo de camarão ser relativamente baixo no Brasil (580 g per capita 2019). Sem contar que, quando falamos de comercialização do pescado, e o camarão não foge à regra, esse fato fica ainda mais agravado pelo comportamento da curva de sazonalidade de consumo e pela ainda pouca capilaridade de comercialização.
 
Somado a esse cenário, a COVID-19, assim como em outros segmentos, trouxe uma pressão ainda maior no mercado do camarão, tanto no preço quanto no fluxo de vendas, com alguns setores da indústria alimentícia praticamente fechados ou com fluxos de compra drasticamente reduzidos, como foi o caso do food service e o varejo. O impacto foi duramente sentido para os produtores que tiraram camarão nesse período, além de expor a fragilidade de dependência histórica que o setor produtivo tem dos atravessadores e da venda majoritária do camarão fresco.
 
O momento para a carcinicultura, assim como para toda a economia brasileira, é dramático, ao menos pelos próximos 6-8 meses, refletidos no aumento do desemprego, redução de salários e, claro, diminuição do poder de compra da população. É de se esperar que a retomada desses impactos seja progressiva e que possa trazer mudanças em alguns modelos de comercialização. Ao menos assim esperamos com a carcinicultura, que nesse pouco tempo, mas que parece ser eterno, está tendo algumas experiências, expectativas e perspectivas que podem ser aproveitadas como herança ou oportunidades para momentos futuros, especialmente relacionadas a comercialização, como apontaremos a seguir.
 
Experiências de comercialização: mercado interno
 
Com a lentidão das despescas e preços de comercializações impraticáveis por atravessadores, produtores de vários estados, buscaram como alternativas: (1) vendas diretas ao consumidor, (2) parcerias com supermercados locais e (3) vendas de filé a preços acessíveis. Essas experiências não resolveram o problema da indústria, mas amenizaram e trouxeram uma esperança positiva, principalmente porque aumentaram a viabilidade de comercialização do camarão para o consumidor final, aumentando também o acesso direto ao produto.
 
Experiências de comercialização: mercado externo
 
Com a política de valorização cambial do Brasil, somada à crise provocada pela COVID-19 (o dólar entre janeiro e abril de 2020 valorizou-se mais de 40% frente ao real), o cenário para exportações seria uma saída natural, visto à queda de preços do camarão no mercado interno. Isso, se a epidemia não afetasse também os principais mercados importadores de camarão no mundo: EUA, EU e AS. Contudo, é preciso compreender a evolução ou involução da COVID-19 nesses mercados, e o poder de recuperação que cada um vai ter, mas já se pode adiantar que Ásia, frente aos outros continentes já dá sinais positivos de recuperação, e como mensagem positiva, o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), por intermédio da Ministra Tereza Cristina, anunciou no mês de abril que o Brasil conseguiu habilitar 3 plantas de processamento de camarão para a Coreia do Sul, uma excelente e animadora notícia para o setor. Fica a expectativa que para os próximos meses o Brasil comece a exportar.
 
 
 
Perspectivas futuras para comercialização:
 
Grandes desafios podem trazer oportunidades pela frente. Até o ano passado o Brasil era o mercado consumidor em que todos os países produtores de camarão gostariam de colocar seu produto, e vão continuar querendo assim que o dólar baixar. Afinal, somos 210 milhões de habitantes, de um país emergente, que antes dessa crise tinha uma perspectiva de crescimento da economia de 2% a.a. Não dá para não pensar em oportunidades, somente fora do Brasil.
 
A título de comparação, o México com índices parecidos em 2019, chegou a uma produção de 165.500 toneladas para 2019, para uma população de 126,2 milhões de habitantes, adicionando a pesca extrativa, o consumo per capita chegou a 1,68/kg/habitantes. Se o Brasil tivesse o mesmo consumo, teria que produzir mais de 350.000 toneladas, para atender apenas ao mercado interno.
 
Os exemplos e modelos de comercialização que estamos vivenciando durante essa epidemia, demonstram que, melhorando a acessibilidade e relação de custo benefício entre o produtor e o consumidor, o potencial de consumo no mercado interno poderá crescer exponencialmente. Muitos consumidores ainda têm desconfiança na qualidade do camarão, devido aos preços praticados, tamanhas margens dos atravessadores, um desafio com que certamente a indústria terá que se preocupar. Imagem e marketing de organização setorial poderão ajudar, assim como vemos em outras atividades.
 
Em relação ao mercado externo, o grande desafio para os próximos meses é conseguir a abertura para exportar para o mercado chinês, que hoje é o maior importador mundial de camarão, e cuja demanda, devido aos problemas de produção, tende a crescer para os próximos meses. Outro ponto importante é a liberação para retornar a exportar para Europa. Assim, o Brasil, estaria habilitado para exportar para os principais mercados importadores de camarão no mundo.
Por   Diego Maia Rocha/ Aquaculture Brasil
Foto: Divulgação